sábado, 23 de junho de 2012

Filhos


Filhos são pessoas que a gente aprende a amar devagarinho,
na feitura do tempo e do olhar...

Chegam como sementes que pedem para florir
Pedem nosso colo, nossa mão...
Choram nossa falta.
Inventam alegrias
E nos fazem seres melhores!

Crescem com o tempo no nosso amor,
Na nossa curiosidade...
Palavras engraçadas,
Beijos molhados!
Febres na madrugada...

Aniversários coloridos na alegria..!
Abraços apertados desenrolando presentes!
Vovô, vovó, tios, tias e primos...!

Jogos, frutas e brincadeiras...
Brinquedos espalhados pelo chão...
Escolinha, amiguinhos, praças e parquinhos...

Mãos pequenas crescendo em nossas mãos...!
Soltando–se de nossas mãos...
Buscando outros espaços...!

Lápis nas mãos, já querem representar o mundo...
Desenhos nas paredes,
Flores para a mamãe!

Machucados e frustrações para cuidar...
O bichinho que morreu...
O vovô que deu adeus...
E uma dor para entender...

Nosso coração vai se alargando...
Pedem espaço,
Pedem soltura...
Querem correr...!
Tudo é bom de ver,
Nada se pode perder.

Turmas, esporte e competições...
Posso nadar? Posso ir com o coleguinha?
Posso crescer sozinho...?

E essas crianças vão crescendo no tempo...
Olhando seus caminhos...
Escolhendo companhias para dividir o amor...
Selecionando opções ...

Quanto amor aprendemos como pais!
Quanto tempo e vida ganhamos!
Quanto perdemos por não ver tudo...
No corre-corre da vida de cada um!

Filhos são porções de luz!
Preocupações na nossa vida...
São doces amores !
Brisa fresca na alma...
Sonhos nos nossos sonhos.

Presentes embrulhados por Deus
E que nossas mãos desenrolam ,
Cuidam...
E conduzem ...
Errando e acertando,
No nosso amor desmedido,
Na nossa imperfeita condição...

Sempre orando por eles!
Esperando por eles...
Na saída da escola,
Na noite que não acaba,
No tempo que os transformam em jovens e adultos.

Estão bem? Dormiram? Comeram? Estão felizes?
Até quando vamos cuidar?
Tem um fim de ser pai? De ser mãe?
Tem um amor igual?

Filhos não são nossos...
Mas são extensões dos nossos olhares,
Dos nossos valores,
Extensões da nossa vida...!

E são o que são, diferentes de nós...!
Vão se fazendo eles nas suas escolhas,
Nas suas dores,
Nos seus encontros com o outro.
Um dia trançando entre nossas pernas,
No outro saindo para o mundo conquistar...!

De repente levantam o diploma e se livram da beca!
O tempo passou em volta deles ,
Vão alçar seus voos...
Outros ninhos construir,
Trazer seus frutos para nossa vida florir.

E esses pais-avós vão ficando na terra que já deu a semente...
Daqui a pouco se dissolvem no universo...
Dão espaço para novas sementes de amor,
Mas do coração de seus filhos não se despedem.
Amor eterno e infinito
misturado no ar de nossa existência.

Um fato triste:
Não são todos os pais que amam,
Não são todos os filhos que crescem adubados e hidratados de amor...
A vida não é tão bela para todos.
Às vezes há crianças que não conheceram o amor de pai e mãe.
Essas dores do mundo...
Das misérias do humano...

Até isso a gente mostra,
A vida é isso que se vê...
É belezura, mas é dor e concretude também.
É perda...
Imprevisibilidades e sonhos...

Todos nós precisamos de alguém
A nos chamar de pai... mãe...!

Todos nós temos um grito de socorro
que se traduz em Mãe... Pai...!
Luzes de nossas trevas...
Sejam reais,
nossos pais terrenos.
Sejam mistério e providência!
Nossos pais espirituais...

Filhos ...
Amores construídos no nosso corpo,
No ninho da nossa vida...
Amores do amor de Deus!

Dulce Braz.



quarta-feira, 13 de junho de 2012

Uma conversa sobre o amor, a vida e a morte


Vivemos como se nunca fôssemos morrer...
Porque a vida é bela e o morrer é triste.

Morre o velho, o novo, o sol, o dia...
Morrem alegrias e saudades,
Morrem pássaros e rios,
Morrem pessoas queridas...



Morre na gente a vida idealizada.
Nascemos mais velhos no olhar...
Falta um pedaço, falta o calor da presença viva.

Fica uma história, uma fala, um sorriso,
Um jeito de querer bem...
Amor resignado e impotente.

Somos saudade por isso
E esperança no tempo...
O adeus dói. O corpo sente. A alma chora...
Falar de morte incomoda a vida.
Todos vão saindo de fininho de si...

Minha mãe falou da morte
Quando ela veio para ficar.
Chamou no ouvido a cada um
E pediu perdão.

Aquela mulher calada na vida,
Simples em ser, romântica no sentir,
Quase nunca mostrava, em palavras, a sua expressão...
Mas, na sua adolescência, brincou com as palavras escritas
em papeis escondidos que eu li um dia...
Foi professora como eu,
Uma moça bonita e esperançosa.

Uma menina pequena e triste
que ficou sem sua mãe muito cedo...
Mostrava essa falta.
Às vezes falava dela...
Sem saber precisar a presença e a ausência
da sua mãe na sua vida de mulher.
Chorava a ida de um pedaço dela
E em tardes de Ave-Maria,
buscava recuperar a mãe na saudade...

E assim, uma pequena  sem mãe
muitas vezes se mostrou na vida.
Olhava as coisas e as compreendia...
Mas seu silêncio era o que respondia
Quando as palavras preferiam ficar guardadas sem sair.
Porque tinha medo de dizer o que não devia
E ofender nunca queria.
  
Um respeito mostrava pelas nossas escolhas...
Comida quentinha na hora certa,
Casa arrumada.
Sua amizade aos cães, plantas e flores...
Um vaso sobre a mesa, flores pelos cantos
E um fuxico no sofá.

Seu companheiro foi bem cedo também...
Ela se despediu sem se dar o direito de chorar a perda.
E a sua solidão não a revelou escancarada,
Quis ser esteio,
Cobrir o teto para o abrigo da família partida;

Continuou arrumando a vida e a casa,
Um aconchego com o sabor da comida na cozinha
E uma música para alegrar em seu corpo e no lar
a saudade do seu amor...

Um dia a vi chorando no alpendre...
Era uma tarde de saudade
E havia uma música no aparelho de som.
Sentei-me ao lado dela,
Mas palavra ela não falou...
Enxugou as lágrimas,
Guardou a saudade
E de outras coisas começamos a falar.

Um tempo depois
A morte veio chegando, querendo conversa...
Foi falando aos poucos, em muitos momentos,
Cirurgias, exames, quimioterapia e radioterapia.
Um ano, dois... cinco...
Tentativa de escapar,
Tentativa nossa de esquecer.
Um dia após o outro
Sempre era mais um dia.
Festas para comemorar a vida
Música para dançar.

Até que a desesperança veio nos exames,
Na fala médica,
No nó na garganta que amarra as palavras e a alegria,
No aquietamento dela em si mesma.

Depois se levantou do tombo pior desta vida,
Arrumou o corpo,
Chamou as amigas para compartilhar um chá e uma oração...
E presenteou-as com um vaso de flores de fuxico.

Enfeitou o lar...
Um presente aqui. Outro ali. 
Queria repartir o amor
e um pouquinho de si em tudo que passou a fazer.

Do médico querido, despediu-se,
Deixando com ele um símbolo de proteção
E o desejo de luz em seus caminhos profissionais.

A um padre solicitou
Uma bênção para ela e a família.
Casou a filha caçula,
Abençoou as alianças e o sim.
Planejou a mesa farta,
A alegria do encontro
E o momento da despedida.

Pediu música no quarto...
Quase 24 horas de música que um e outro filho trazia.
Queria dançar no céu,
Rodopiar nas nuvens!

Lembrou casos engraçados, um pouco da sua história...
Chamou os filhos. Buscou os netos...
Apenas dois jovens netos distantes, mas seu amor os trouxe em pensamento!
E a cada um e a seu tempo
um sussurro de perdão e uma declaração de amor ela deixou.

Agradeceu pela palavra dita,
Pela expressão do perdão.
Revisou seu papel de mãe...
Foi severa demais?
Falou pouco de amor?

Tudo no seu lugar... Como tinha que ser, mãezinha...!
Fez o que deu conta de fazer.
E somos agradecidos demais,
Por ser o que foi...
Você conquistou nosso respeito,
Fez-nos entender a limitação de ser no mundo.

Mostrou-se limpa, sem mágoa... pronta para ir.
Uma frase para a lápide...
E a foto escolhida do dia do seu casamento,
Revelando a mocidade a sorrir sonhadora
Com uma história por construir...

Abraçou, beijou, falou eu te amo!
Soltou-se de nossas mãos,
Fechou os olhos...
Abriu-os e pediu ao Divino pela proteção dos seus filhos e netos.

Já não pensava mais em si.
Estava solta,
Estava em paz...!
A dor a abandonou.
Ela dizia: não estou sentindo dor, minha filha...

Com suas mãos buscando as minhas,
Pensou e falou em flores de fuxico 
A enfeitar uma roupa branca
Que ela vestiria para o encontro com Deus.
Depois fechou os olhos...
E soltou suas mãos das minhas...


Acendi a vela do Santíssimo!
Um a um os filhos foram chegando sem precisar que fossem chamados. 
E a envolvemos em um círculo de silêncio e espera...
Sem choro alto,
Sem desespero...
Só com amor e silêncio doído.
E ela foi assim...

E ela ficou assim em nós...  meiga e serena,
Nos ensinando sobre o morrer e o viver.

Com seu adeus em amor,
Falou da morte...
Olhou-a nos olhos e se pôs pronta.
Sem alarde, sem chorar...
Uma fortaleza a nos ensinar a vida e a morte
No seu jeito de ter sido a nossa mãe.


Dulce Braz.
A frase escolhida por minha mãe para deixar aos que ama:
“Não chore. Morrer não é o fim. Morte é vida! Paz!...



terça-feira, 5 de junho de 2012

Dia dos Namorados...


O que faz com que um homem e uma mulher se encontrem no tempo? Olhares que se olham, atração de sentimentos e corpos, a   natureza do ser convidando a amar?

Dia dos namorados nos oferece o pensamento sobre o que é o amor entre duas pessoas que se escolhem. Esse buscar alguém para viver a vida que a gente quer viver menos só. Olhar com o olhar do outro  e olhar com o nosso desejo.

Querer encontrar o outro, beijar sua mão, sua vida, seguir com ele seus passos. Encontrar-se e desencontrar-se na vontade de acertar.  Fazer do encontro abertura para o amor que a gente quer edificar.

Um homem e uma mulher, o feminino e o masculino em busca de integração.  Força da natureza a buscar conexão. Inventamos o amor ou o amor nos reinventa? 

A paixão fisga seres no tempo. Apaixonar-se torna o encontro ideal e anima a vida. Buscamos a construção com o outro, mais fácil olhar o mundo a dois, cuidar do outro e se deixar ser cuidado. Amor das histórias, dos romances, amor dos encontros, amor das palavras. 

Lembrando Rubem Alves, quando o fogo do amor carnal cessar, que as palavras possam continuar acendendo a chama do desejo de permanecer. Que não só  de sexo vivam os amores. Mas de toda palavra que venha do coração e do desejo de fazer o outro e a si mais feliz.

A comunicação é vital para o amor, mas é fonte de mal entendidos também. Resta a vontade de compreender. Ler a palavra e o gesto. Desejos e encontros. Projetos a dois. Construção de caminhos por trilhar.

Não é fácil viver a vida juntos sem olhar cada um para si e um para o outro. Manter nossa individualidade e respeitar a do outro. Mente quem diz que temos que ser um em dois. Mente quem diz que existe um final feliz para sempre... o amor é construção, é dor, é alegria, é desilusão e fantasia. Amar é razão e emoção; não pode ser só razão. Nem só emoção.

Proposta de namorar é pedido de caminho a dois, é pedido de companhia, de água que molha a planta para crescer. Para florir. É encontro da  intimidade, sentir o gosto do outro. O cheiro do outro. A palavra e o silêncio.

Namorados eternos são os dos contos de fada. Somos seres reais, nessa busca do outro em nossa vida. Os príncipes e princesas nos reinos encantados moram em nós, mas o encanto pode acontecer sem ser na fantasia somente. Há o encontro de momentos, de olhares, de sussurros. De verdades. De tristezas. De histórias no tempo.

Colocamos no outro nossas expectativas, nossa necessidade da completude. Queremos que o outro nos faça feliz, e nos esquecemos de que essa busca é individual. Mas nada mal termos quem nos ajude a buscar, a nos motivar para nossas conquistas. Quem nos dá a liberdade de buscar e a oportunidade de compartilhar os motivos que nos impulsionam a continuar.

Os poetas cantam o amor, idealizam as relações, nos cantam e  encantam em nós o desejo do outro, de ser no outro.

Nosso primeiro olhar para o que acontece entre um homem e uma mulher está registrado em nós, em algum lugar de nossas memórias. Um desejo de integração ficou registrado. O jeito que fomos cuidados lá nos nossos primeiros anos de vida, o entendimento da importância de uma relação na nossa vida, a importância do outro para que pudéssemos ser. A função daquele que tem um significado importante e vital fica em nós para sempre.

Queremos amar um outro ideal, queremos ser reconhecidos pelo outro, conhecer o outro. Amar o outro em nós e nos sentir amados. 

Dia dos namorados convida a momentos de intimidade,  de compartilhar, de brindar os encontros, a amar o outro sonhado em nós, a fazer história.

A pensar nesse tipo de amor ou de conexão que nos trouxe à vida. Somos quem somos porque duas pessoas se encontraram no tempo, somos resultado de duas vidas e de muitas que passaram por nós em inter-relação.

Feliz dia dos namorados!

Dulce Braz.
 junho de 2012.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Uma gota de amor




Compartilho um momento de graça e mistério. Nada a explicar. Fico com a contemplação e  a reverência.
Para esses fatos eu digo amém!



Um dermatologista me alerta sobre um sinal de perigo em meu corpo. Um cancerzinho de pele. Opa! Medo me assalta. Meus pensamentos agitam minha rotina. Sinal de perigo! Sou encaminhada a um cirurgião para remoção do invasor dali a 20 dias. Tempo maldito! Eu e minha preocupação. Silêncio que me atordoa. Tempo que não chega.

Deus é capturado na minha emoção. Um poder espiritual sempre me dando sinais de sua presença em tantos momentos de minha vida, Tantos! Manifestado na opulência da natureza, na perfeição, em tantas decisões da minha vida, na assistência que surge de onde menos espero, no trivial da existência, na rua, na chuva, no mar, no sol, na nova vida de uma criança que chega, em um texto que cai em minhas mãos, numa palavra que ouço ou em alguém que aparece com um recado despretensioso e que era tudo que precisava. Quanta graça!

Aquele meu medo estrondoso busca auxílio em um transcendental que me acolhesse. 

Fui a uma missa da Cura. Padre Danilo, Paróquia Nossa Senhora Mãe da Igreja. Belo Horizonte. Eu, entre tantos que ali buscavam, me pus em oração. Incapaz que era, entreguei ao Altíssimo o diagnóstico médico. O padre passou entre nós com o Santíssimo: momento de poder que emana de um objeto reluzente, alicerçado por desejos e almas de tantos... Energia intensa!

Esse homem, que, por acaso é o padre Danilo, reveste sua humanidade de mostras de uma luz espiritual que parece emanar de entranhas mais profundas de seu ser. Essa luz reflete quando ele passa com o Santíssimo perto de nós e depois ao passar novamente borrifando-nos de água benta.

Fecho os olhos na esperança de receber uma gota sequer da água santificada. Percebo respingos da água em mim e especialmente uma gota no exato lugar onde eu deveria recebê-la. Eu protejo o líquido precioso, como para não perdê-lo, cobrindo-o com minha mão direita no lugar em que meu corpo se sente úmido.

Está entregue! Seja feita a Vossa vontade! Reverencio o poder que sinto me atingindo por inteira! Entrega e gratidão!

Espero no tempo. Chega o dia em que vou ao cirurgião para uma biópsia. Ele examina o local, mas não encontra nada a fazer. Não havia nem um sinal de perigo na região suspeita que examinava. Tudo em perfeita ordem! Tem certeza de que não há nada na minha pele? O médico responde que não! Nem um sinal de preocupação! Recomenda-me cuidados triviais e vou-me embora.

Uma alegria me invade e eu agradeço ao cosmo, à assistência, ao poder infinito de amor, ao que não entendo e não vejo com os olhos do corpo, mas enxergo com os olhos da alma e do amor.

Dulce Braz